sexta-feira, 5 de junho de 2009

Nossa convidada... Carolina Padreca



A escolha da profissão é sempre uma tarefa árdua, pois com 17 ou 18 anos o adolescente já tem que ter maturidade suficiente para arcar com a decisão sobre seu futuro profissional, que por sua vez ditará o cotidiano inclusive do setor pessoal do indivíduo.

Jornalismo! Essa foi minha escolha e minha escola. Porém, 11 anos após meu ingresso na faculdade de comunicação me entristeço em perceber que a poesia, a literatura, o jornalismo interpretativo está sendo esquecido pela maioria dos meus colegas e principalmente pelos meios de comunicação.

Informações rápidas e muitas vezes sem profundidade têm tomado conta da mídia, seja ela impressa, online, televisiva ou radiofônica.

É por isso que me inspiro quando leio um bom livro, um bom artigo ou alguma reportagem completa, principalmente sobre cultura.

Se escolhi o ofício de jornalista foi por saber que somos capazes e mais ainda responsáveis por levar a informação à comunidade. Mas é fato que esse ato de “informar” pode ser feito de diversas maneiras. Eu optei pelo caminho do interpretativo, do literário.

O leitor, em matérias feitas por esse viés, é capaz de sentir os aromas, ouvir os sons, ver os movimentos. É você possibilitar à leitura o contato com o fascinante mundo do imaginário.

Cada personagem é dono de uma vida, uma história, que numa simples nota informativa perde toda a riqueza. Os detalhes bem colocados são fundamentais para expor ao leitor toda simpatia, carisma e dedicação do personagem, que lembrando, é real.

Abaixo, escrevo sobre Clarice Lispector, escritora, jornalista, mulher espetacular que há pouco tempo conseguiu isso, explorar os sentimentos e trazê-los de forma forte e poderosa para a leitura.

Espero assim, que os leitores do itu.com.br tenham uma deliciosa leitura e se animem em conhecer mais tanto sobre Clarice, como sobre o Jornalismo Literário (Interpretativo), duas de minhas paixões.

A sensibilidade de Clarice
A escritora que fez do jornalismo seu ofício e da literatura inspiração

A ucraniana Haia Lispector nasce em 1920, durante uma viagem dos pais, que estavam de mudança para a América. Dois anos depois a menina chega à Maceió e por iniciativa do pai, toda a família muda de nome. Ela, então, passa a se chamar oficialmente Clarice.

Apesar de passarem por algumas dificuldades, Clarice consegue estudar, não somente na escola regular, como faz aulas de piano, hebraico e iídiche. No mesmo ano (1930) que se naturaliza brasileira, se inspira na arte e escreve "Pobre menina rica", peça em três atos, infelizmente perdida com o tempo.

É neste momento que nasce a escritora que até hoje encanta pelas leituras enérgicas, profundas e atemporais.

A diferença dos textos de Clarice para com as demais crianças da época estava no fato de não descrever pessoas nem situações, mas apenas sentimentos e sensações, não se enquadrando nas literaturas infantis: eram textos maduros demais para sua pouca idade.

De lá para o Rio de Janeiro, já adolescente, cursa a língua inglesa e inicia o ofício de professora particular, mais uma vez para ajudar nas despesas da casa. Na fase adulta, após trabalhar como tradutora de textos científicos para revistas e também como secretária de advogados, passa a exercer o cargo de jornalista, escrevendo reportagens em jornais, mas não deixando de confeccionar textos literários.

Publica seu primeiro romance "Perto do coração selvagem", em 1942. Lauro Escorel a partir da leitura de um exemplar a descreve: "personalidade de romancista verdadeiramente excepcional, pelos seus recursos técnicos e pela força da sua natureza inteligente e sensível".

Neste mesmo ano, sua vida dá mais uma guinada e consegue seu primeiro registro profissional como escritora no jornal "A Noite". Nunca deixando de estudar, cursando agora antropologia e psicologia. No ano seguinte além de se formar em direito, casa-se.

É autora de contos, crônicas, artigos e romances, em mais de 27 livros como "O Lustre" (1946), "Laços de Família" (1960) e a tão comentada obra de despedida da autora: "A hora da estrela" (1977).

Clarisse foi uma personalidade que se entregou ao Brasil de corpo e alma. Incansável estudiosa, tinha sede de aprofundamento e aprendizado nos diversos setores humanos, talvez procurando entender esse turbilhão de emoções e sentimentos que norteiam o homem.

Questionadora, Clarice fez do jornalismo, das palavras escritas, seu ofício e sua vida.

Era uma artista. Respirava e vivia de sua arte. Sem a escrita, como ela mesmo descreveu, se sentia “amordaçada, presa, perdida”.

A inquietude, outra forte característica da autora, proporcionou e ainda proporciona aos leitores, contínua reflexão sobre os verdadeiros valores da vida, fornecendo chaves para desfazer as amarras que impedem as pessoas de lutarem por grandes e audaciosos objetivos. Seus escritos fornecem novos ângulos de visão sobre o cotidiano e o interior dos leitores. É uma conexão, mesmo póstuma, da alma de Clarice com cada novo olhar.

Trechos de suas obras traduzem de forma clara, as contradições existentes e muitas vezes esquecidas, como transbordam sensibilidade:

"Gosto dos venenos mais lentos, das bebidas mais amargas, das drogas mais poderosas, das ideias mais insanas, dos pensamentos mais complexos, dos sentimentos mais fortes… tenho um apetite voraz e os delírios mais loucos. Você pode até me empurrar de um penhasco que eu vou dizer: - E daí? Eu adoro voar!
Não me deem fórmulas certas, por que eu não espero acertar sempre. Não me mostrem o que esperam de mim, por que vou seguir meu coração. Não me façam ser quem não sou. Não me convidem a ser igual, por que sinceramente sou diferente. Não sei amar pela metade. Não sei viver de mentira. Não sei voar de pés no chão. Sou sempre eu mesma, mas com certeza não serei a mesma pra sempre"

"Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. Tem o peso da palavra nunca dita, prestes quem sabe a ser dita. Tem o peso de uma lembrança. Tem o peso de uma saudade. Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros".

Que os profissionais de hoje se inspirem em suas palavras, que registram a essência do que é amar, do que é sentir, do que é sofrer e chorar, do que é viver. Por que: do que é feita a vida, senão um equilíbrio de razão e emoção?

Carolina Padreca é jornalista especialista. Atua na área cultural de Salto, é vocalista do Grupo Releitura (MPB) e assessora voluntária de grupos artísticos da cidade. É professora universitária nos cursos de Eventos, Turismo, Hotelaria e Secretariado Executivo do Ceunsp. Membro fundadora da “Academia Saltense de Letras” tem Clarice Lispector como sua patronesse. Acesse o blog de Carolina: http://www.inebriada.blogspot.com/.


*Fonte: Entrevista concedida pela jornalista ao site http://www.itu.com.br/,no dia 30de abril de 2009.


Amigos !!Carolina Padreca será nossa entrevistada de amanhã. O programa promete. Não percam!!
Aline Romariz e Marise Mell